ACP analisa fármacos sem registro na ANVISA



TJ-MG - Agravo de Instrumento Cv : AI 10231060740512002 MG  Inteiro Teor

Publicado por Tribunal de Justiça de Minas Gerais - 2 meses atrás


EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - PAPILOMATOSE LARÍNGEA RECORRENTE - FÁRMACO CIDOFOVIR NÃO COMERCIALIZADO NO BRASIL, SEM REGISTRO NA ANVISA, BEM COMO NÃO FAZ PARTE DA RELAÇÃO DA FARMÁCIA BÁSICA DO MUNICÍPIO - SITUAÇÃO GRAVE - RELATÓRIOS SUBSCRITOS POR MÉDICOS CONVENIADOS AO SUS EM QUE ATESTAM A IMPRESCINDIBILIDADE DO FÁRMACO PARA O TRATAMENTO QUE ACOMETE A CRIANÇA - MULTA DIÁRIA - DESNECESSIDADE - EFEITO SUSPENSIVO ATIVO DEFERIDO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO 



AGRAVO DE INSTRUMENTO CV Nº 1.0231.06.074051-2/002 - COMARCA DE RIBEIRÃO DAS NEVES - AGRAVANTE (S): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - AGRAVADO (A)(S): MUNICÍPIO RIBEIRÃO NEVES 


A C Ó R D Ã O 


Vistos etc., acorda, em Turma, a 2ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, por maioria, em DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. VENCIDA EM PARTE A DESEMBARGADORA VOGAL. 


DES. BRANDÃO TEIXEIRA 


RELATOR. 


DES. BRANDÃO TEIXEIRA V O T O 


Versam os autos, agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo ativo, interposto contra a r. decisão trasladada às fl. 33/34-TJ que, nos autos da ação civil pública, com pedido de tutela antecipada, ajuizada pelo agravante em face do agravado, indeferiu a liminar pleiteada, sob o fundamento de que o fármaco CIDOFOVIR, com nome comercial VISTIDE, não tem registro na ANVISA, bem como não faz parte da lista básica de medicamentos disponibilizados pelo Município de Ribeirão das Neves, ora agravado. 


Em suas razões recursais, o agravante relata que: no dia 22.11.2006, a Sra. Denise Fernandes dos Santos compareceu à Promotoria de Justiça de Defesa do Cidadão da Comarca de Ribeirão das Neves e alegou que seu filho menor, Iago Ricardo Mendes dos Santos, de 06 (seis) anos, é portador de PAPILOMATOSE LARÍNGEA RECORRENTE (PLR), e já foi submetido a 33 (trinta e três) cirurgias, para a retirado de tumores benignos, necessitando de tratamento com o fármaco CIDOFOVIR, cujo nome comercial é VISTIDE; conforme informações médicas, o medicamento requerido seria imprescindível para o tratamento da doença que acomete o filho menor da genitora, representado pelo Ministério Público; a família da criança não tem condições financeiras de arcar com o tratamento; "sem a utilização do medicamento"Cidofovir", não haverá a possibilidade de cura da"Papilomatose Laríngea Recorrente"que acomete o paciente" (sic); após a alegação do Município agravado, de que o fármaco pleiteado não teria registro na ANVISA, o Ministério Público requereu a expedição de ofício à ANVISA, a fim de obter informações sobre o registro do medicamento requerido na inicial, cuja resposta fora de que o produto "Cidofovir" havia se expirado em 02/2003 (fl. 176); requereu na impugnação à contestação apresentada pelo agravado, expedição de ofício à Drogaria Medicvip LTDA, que lhe informou que desconhecia "qualquer tipo de restrição quanto à (...) comercialização" do medicamento (fl. 224); fora demonstrado pelos médicos da criança a imprescindibilidade do medicamento para o tratamento da doença que lhe acomete e, apesar do documento expedido pela ANVISA esclarecer que o medicamento não possui registro e não poder ser comercializado, haveria possibilidade de sua importação mediante a "submissão de uma petição à análise de agência de vigilância sanitária" (fls. 309/313); há vários estudos científicos elaborados por médicos renomados, que comprovam que o fármaco, ora requerido, sem registro na ANVISA e não comercializado no Brasil, é de eficácia satisfatória para a doença que acomete o filho menor da genitora; caso a decisão recorrida seja mantida, a criança será submetida, mais uma vez, a cada dois meses, a procedimento cirúrgico; segundo informações prestadas pela ANVISA seria possível importar medicamento sem registro, desde que requerida em petição dirigida a ela; o fumus boni júris restou demonstrado ante a imprescindibilidade do fármaco para tratamento da doença que acomete o filho menor da genitora, sendo possível a sua importação, ainda que não tenha registro na ANIVSA; o peiculum in mora restou demonstrado ante os danos irreparáveis que serão causados ao infante, caso o medicamento não seja fornecido com a máxima urgência, e considerando que o fármaco é de custo muito elevado (R$4.000,00 a ampola) e incompatível com a renda familiar da criança. Requer seja concedido efeito suspensivo ativo à decisão agravada, a fim de que o agravado forneça, imediatamente, o medicamento "Cidofir" ao infante, Iago Richard Mendes dos Santos, fixando-se multa diária de R$10.000,00 (dez mil reais) para o caso de descumprimento da decisão judicial. Demais disso, requer seja autorizada a expedição de ofício à ANVISA, a fim de que a agência autorize a importação do medicamento. 


Efeito suspensivo ativo deferido às fls. 145/149-TJ. O juízo a quo prestou informações às fls. 155/156-TJ e manteve a decisão agravada. Conforme Certidão de fl. 236-TJ decorreu o prazo sem que o agravado, intimado, se manifestasse. A douta Procuradoria Geral de Justiça se manifestou às fls. 239/241-TJ pelo provimento do recurso. 


Decido. 



JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE 



Conheço do recurso, porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade. 



MÉRITO 



O agravante insurge-se contra decisão que indeferiu o pedido de antecipação de tutela, ao fundamento de que o medicamento pleiteado não é comercializado no Brasil, não possui registro na ANVISA, bem como não faz parte da relação da farmácia básica do Município, ora agravado. In casu, o agravante instruiu a petição inicial com cópia do "Laudo Médico para Emissão de AIH" - Autorização para Internação Hospitalar - subscrito por médico conveniado do SUS, às fls. 108/109-TJ, que atesta que o paciente, Iago Richard Mendes dos Santos, representado pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, é portador de: 


"Papiloma Laríngea Recorrente grave, evoluindo com obstrução de via respiratória inferior, devido a múltiplas lesões papilomatosas localizadas na glote e na epiglote. Foi submetido a cirurgia há, mais ou menos, 2 meses, no entanto, apresentou recorrência das lesões e dispnéia grave, necessitando de nova cirurgia em caráter de urgência." (sic) 


Demais disso, há também nos autos relatório subscrito por médico do Hospital Felício Rocho, às fls. 110/111-TJ, que atesta a imprescindibilidade do fármaco, CIDOFOVIR, para o tratamento da doença que acomete o menor, que assim dispõe: 


"O paciente IAGO RICHARD MENDES DOS SANTOS apresenta papilomatose laríngea recorrente evoluindo com obstrução grave de via aérea inferior e recorrências freqüentes das lesões. Já necessitou de vários procedimentos e inclusive traquiotomia. Está em acompanhamento no HOSPITAL FELÍCIO ROCHO onde tem sido realizado tratamento de vários pacientes com a mesma doença com aplicação intralesional do CIDOFOVIR, medicação antiviral não disponível no Brasil. Este medicamento está em evidência no mundo inteiro e os resultados positivos tem sido visto com entusiasmo. No entanto a medicação é cara e o paciente carente não tem como adquiri-la. O caso de Iago é grave e temos segurança de resolução com o uso do medicamento visto que conseguimos cura com outros pacientes."


Assim sendo, considerando que os relatórios supramencionados foram subscritos por médicos conveniados do SUS, e atestam a imprescindibilidade do fármaco, CIDOFOUR, para o tratamento da doença que acomete a criança, Iago Richard Mendes dos Santos, representado pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, seria conveniente e oportuno que o Município de Ribeirão das Neves, ora agravado, providenciasse todos os meios necessários para o fornecimento do fármaco, ora requerido na inicial. 


Registre-se que, conforme informações prestadas pela ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária - às fls. 123/124,"... o produto Vistide (CIDOFOVIR) não possui registro nesta ANVISA, portanto não pode ser comercializado no Brasil. Todavia,"é possível a importação de um medicamento ainda não registrado pela ANVISA, mediante submissão de uma petição à ANVISA, (...)."


Deste modo, considerando que a ANVISA não está sujeita à jurisdição da Justiça Estadual, não merece prosperar o pedido do agravante, a fim de que seja determinada expedição de ofício requisitório à ANVISA, para obrigá-la à importação do medicamento requerido na inicial. 


E isto porque, dada a excepcionalidade da ingerência do Poder Judiciário nos impostergáveis serviços e ações da política sócio-econômica da alçada do Poder Executivo na área da saúde, caberia, in casu, somente impor ao Município de Ribeirão das Neves, ora agravado, solicitar a importação do fármaco à ANVISA, mediante apresentação dos documentos requeridos às fls. 123/124-TJ. 


Por fim, não merece prosperar o pedido do agravante, quanto à imposição de multa diária de R$10.000,00 (dez mil reais), para o caso de descumprimento da decisão judicial. 


E isto porque, em primeiro lugar, cumpre salientar que a possibilidade de imposição de multa para caso de descumprimento de ordem judicial, consistente em obrigação de fazer, encontra respaldo no ordenamento jurídico pátrio. Porém, possuo entendimento diverso e não tenho aderido à imposição genérica de multa a entidades da Administração Pública. Isso porque tal imposição resulta em privação de recursos públicos escassos, para atenção de interesses muitas vezes pertinentes a uma pessoa, somente. Em tais situações, a apenação de crime de desobediência poupa recursos públicos e é igualmente eficiente. 


Ressalta-se ainda que a multa não pode ser revertida em prol do particular, sob pena de locupletamento ilícito. Além disso, o artigo 14, parágrafo único, do Código de Processo Civil, prevê a possibilidade de fixação de multa quando as partes não cumprem ou criam embaraços à efetivação de provimentos judiciais, sendo que, ao final do processo, esta multa será inscrita como dívida ativa. Constata-se, então, que seria inútil fixar uma multa em face do Município ou do Estado para, posteriormente, inscrevê-la na dívida ativa deste mesmo ente ou de alguma entidade de sua administração indireta. 


Por último, no mais das vezes, o cumprimento da obrigação pelo ente estatal depende de providências administrativas ou de atendimento de outros pacientes em igual ou semelhante situação de urgência, já listados para esse fim. 


CONCLUSÃO 


À luz de tais considerações, DÁ-SE PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, para determinar que o Município de Ribeirão das Neves, ora agravado, providencie todos os meios necessários para o fornecimento do fármaco, CIDOFOVIR, ao filho menor da genitora, IAGO RICHARD MENDES DOS SANTOS, no prazo de 30 dias, intimando-se o Exmo Sr. Prefeito Municipal, para que cumpra tal decisão no referido prazo, sob pena de cometimento de crime de desobediência. 


Custas ex legis. 


DES. CAETANO LEVI LOPES - De acordo com o (a) Relator (a). 


DESA. HILDA MARIA PÔRTO DE PAULA TEIXEIRA DA COSTA 


V O T O 


EMENTA ALTERNATIVA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO - TRATAMENTO PRESCRITO - DIREITO À SAÚDE - MULTA DIÁRIA - POSSIBILIDADE - RECURSO IMPROVIDO. 


- Constitui direito do cidadão a saúde e incumbe ao Poder Público o fornecimento de medicamento bem como o custeio do tratamento àquele que careça de cuidados médicos para preservação ou restauração de sua higidez física e mental. 


- Tem se admitido a imposição de multa cominatória ao devedor, mesmo que este seja a Fazenda Pública, quando se trata de obrigação de fornecer medicamento necessário à sobrevivência do cidadão. 



Rogo vênia ao em. Des. Relator, para divergir, em parte, de seu judicioso voto e dar provimento ao recurso, pelas razões que passo a dispor. 

À fixação de multa diária, conforme § 5º, do art. 461, do CPC, poderá o Juiz, de ofício ou a requerimento, determinar a fixação de multa por atraso no cumprimento da obrigação de fazer, para a efetivação da tutela especifica ou a obtenção do resultado prático equivalente. 

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento § 5o Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial. 

Nesse sentido, o objetivo do Magistrado ao fixar as astreintes é garantir a efetividade do processo, compelindo o devedor a cumprir com a obrigação a ele imposta, fazendo-o abdicar do descumprimento voluntário de tal obrigação. 



Esse é também o entendimento do STJ: 

PROCESSUAL CIVIL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. OBRIGAÇÃO. 

DESCUMPRIMENTO. ASTREINTES. BLOQUEIO DE VALORES EM CONTAS PÚBLICAS. 

MATÉRIA NÃO PREQUESTIONADA. SÚMULA 356/STF. 

1. A ausência de prequestionamento de matéria suscitada - bloqueio de valores em contas públicas -, inviabiliza o acesso á via extraordinária, ante o óbice da Súmula 356/STF. 


2. É possível a fixação, pelo juízo ou a requerimento da parte, de astreintes contra a Fazenda Pública pelo inadimplemento de obrigação. Aplica-se, no caso, o disposto nos artigos 461 e 461-A do CPC. 


3. Recurso especial provido em parte. 


(REsp 1067211/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/09/2008, DJe 23/1/2008) 


Importante salientar, ainda, que a imposição da multa diária, de natureza coercitiva, deve ser feita com razoabilidade em relação ao objetivo que visa atender. Assim, no caso dos autos, considerando que a astreinte visa à defesa de direito inerente à dignidade da pessoa humana, o valor arbitrado atende os requisitos mencionados. 


Em face do exposto, e rogando vênia ao em. Des. Relator, dou provimento ao agravo de instrumento, para determinar que o Município de Ribeirão das Neves, providencie todos os meios necessários para o fornecimento do fármaco, CIDOFOVIR, ao menor IAGO RICHARD MENDES DOS SANTOS, no prazo de 30 dias, intimando-se o Exmo Sr. Prefeito Municipal, para que cumpra tal decisão no referido prazo, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (um mil reais), limitada a R$30.000,00 (trinta mil). 


Custas recursais, pelo agravante, isento de pagamento, na forma da lei. 

SÚMULA:"DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. VENCIDA EM PARTE A DESEMBARGADORA VOGAL." 

Comentários

  1. Boa tarde, minha Mãe começou o tratamento aquase um mês da Hepatite C Genótipo 1;F4. Hoje ela teve um a consulta e a médica disse que ela esta com anemia e por isso vai continuar a fazer o tratamento Duplo, minha dúvida é na questão da medicação da anemia ela me disse que não se da nenhum remédio.Isso é comum?
    Att Elaine Vasconcellos

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  2. Se o governo liberou 5.500 telaprevir/boceprevir para doentes GRAVES, em Um Milhão de Infectados, Imagine esse que ainda nem foi aprovado? Só pra quem pode esperar mais uns 5 anos!!!

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