Com base no Artigo 17, Parágrafo Único da RN 192/2009 da ANS.
PROCESSO: 0136265-83.2013.4.02.5101 (2013.51.01.136265-4)
AUTOR: AUTARQUIA DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR DO ESTADO
DO RIO DE JANEIRO-PROCON-RJ
RÉU: AGENCIA NACIONAL DE SAUDE SUPLEMENTAR - ANS
JUIZ PROLATOR: FLAVIO OLIVEIRA LUCAS
DATA DA CONCLUSÃO: 06/02/2014 17:13
SENTENÇA TIPO: A - FUNDAMENTAÇÃO INDIVIDUALIZADA
S E N T E N Ç A
AUTARQUIA DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – PROCON/RJ, ajuizou ação coletiva em face da AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR – ANS, requerendo, em antecipação de tutela, a suspensão da eficácia do parágrafo único do artigo 17 da RN 195, de 14 de julho de 2009, da ANS. Ao final pugnou pela confirmação da tutela antecipada, no sentido de anular o parágrafo único do artigo 17 da RN 195, de 14 de julho de 2009, da ANS e, assim,
“permitir que os consumidores possam rescindir o contrato sem que lhe
sejam impostas multas contratuais em razão da fidelidade imposta de 12
meses de permanência e 2 meses de pagamento antecipado de mensalidades,
sob pena de multa diária”. Requereu, ainda, a condenação
da ré na obrigação de publicar, às suas custas, em dois jornais de
grande circulação, em quatro dias intercalados, sem exclusão do
domingo, em tamanho mínimo de 20 cm x 20 cm, a parte dispositiva
de eventual procedência dos pedidos, para que os consumidores dela
tomem ciência, oportunizando, assim, a efetiva proteção de
direitos lesados.
Como causa de pedir, aduziu, em resumo, quer o acima citado dispositivo da RN ANS 195/2009, na medida em que “introduz
uma descompatibilização entre proteção do consumidor com a Lei 8078/90
c/c sua própria finalidade institucional trazida no bojo do artigo 3º
c/c artigo 4º, XXXVI da Lei 9961/2000 c/c artigo 2º c/c artigo 3º,
XXXVII do Decreto n. 3327/2000”, contraria os artigos 4º, I, III,
6º, II, IV, V, 22, 39, IV, V, 47, 51, I, IV, XV, §1º do Código de Defesa
do Consumidor, “norma hierarquicamente superior”. Ao fazê-lo o
atacado ato administrativo “gerou insegurança jurídica para os
destinatários do sistema jurídico, ora consumidores beneficiários dos
planos coletivos por adesão”.
Anexou documentação às fls. 24/28.
Postergada apreciação do requerimento de concessão da tutela antecipada à fl. 31.
Contestação apresentada
às fls. 35/56 pugnando pelo indeferimento da antecipação de tutela, por
falta de urgência na medida em que o ato administrativo já vige há mais
de 4 (quatro) anos. Sem preliminares, aduz, no mérito, que nenhuma
ilegalidade há no ato administrativo editado pela ANS, que atuou “dentro
dos limites previstos na Lei nº 9.656/98, no sentido do exercício da competência da regulação do mercado de saúde suplementar”. Anexou documentação constante de fls. 57/64.
Em parecer de fls. 70/71 o MPF opinou
pela improcedência do pedido, embora, ao que parece, tenha compreendido
de forma equivocada o pedido formulado na presente demanda e, por
conseguinte, os seus fundamentos.
Relatados, passo a decidir.
Cuidando-se de matéria de direito, o
feito não comporta dilação probatória, pelo que procedo ao julgamento
antecipado da lide, nos termos do artigo 330, inciso I do CPC.
Assim está redigido o dispositivo questionado, verbis:
“Art. 17. As condições de rescisão do
contrato ou de suspensão de cobertura, nos planos privados de
assistência à saúde coletivos por adesão ou empresarial, devem também
constar do contrato celebrado entre as partes.
Parágrafo único. Os contratos de planos privados de assistência à saúde coletivos por adesão ou
empresarial somente poderão ser rescindidos imotivadamente após a
vigência do período de doze meses e mediante prévia notificação da outra
parte com antecedência mínima de sessenta dias”.
Diante dessa previsão, conclui-se que
os beneficiários dos planos privados de assistência à saúde
coletivos por adesão ou empresarial não poderão rescindir o contrato
antes de completar 12 meses de fidelidade, notificar e pagar
antecipadamente 2 meses de mensalidades referente ao plano contratado,
medida que na avaliação do Autor desconsidera a determinação legal de
reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor, restringindo o direito
de livre escolha do consumidor, através de cláusulas contratuais
abusivas formuladas com apoio do ato administrativo editado pela ANS.
O Autor sustenta incompatibilidade do
disposto no parágrafo único do Artigo 17 da Resolução Normativa
195/2009, no que diz com a autorização para que os planos de saúde
estabeleçam fidelidade contratual de um ano e cobrança de dois meses
antecipados da mensalidade em caso de pedido de rescisão pelo cliente,
com princípios estatuídos em dispositivos da Lei nº8.078/90.
Também afirma que o teor do dispositivo
acima reproduzido, na medida em que protege interesse dos Planos de
Saúde em detrimento do interesse do consumidor/beneficiário, choca-se
com as finalidades institucionais da Agência Nacional de Saúde
Complementar, na medida em que o artigo 4º, inciso XXXVI da Lei nº
9.961/2000 diz competir à Agência em questão “articular-se com os
órgãos de defesa do consumidor visando a eficácia da proteção e defesa
do consumidor de serviços privados de assistência à saúde, observado o
disposto na Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990 articular-se com os
órgãos de defesa do consumidor visando a eficácia da proteção e defesa
do consumidor de serviços privados de assistência à saúde, observado o
disposto na Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990”.
Vejamos.
Como se sabe, para fins de classificação
de planos ou seguros de assistência à saúde comercializados por
operadoras, estes foram segmentados em: a) de contratação individual
ou familiar; b) de contratação coletiva empresarial; e c) de
contratação coletiva por adesão. A categoria de
contratação coletiva empresarial abrange os planos de saúde que oferecem
cobertura da atenção prestada à população delimitada e vinculada a
pessoa jurídica. O plano de saúde de contratação coletiva por adesão é
aquele que embora oferecido por pessoa jurídica para massa delimitada de
beneficiários, tem adesão apenas espontânea e opcional de funcionários,
associados ou sindicalizados.
Quer
se trate de plano/seguro de contratação individual ou de contratação
coletiva, o usuário terá sempre em seu favor as normas de proteção do
CDC, pois ambos são típicos contratos de consumo. Os direitos
do segurado em contrato (plano) coletivo de assistência à saúde são
praticamente idênticos àqueles decorrentes da contratação direta
individual, resumindo-se no direito que ele tem de exigir o cumprimento
das normas e condições pactuadas. Em termos de regulamentação, o
plano coletivo de assistência à saúde encontra-se no mesmo plano
das demais relações contratuais de consumo, no que diz respeito à
aplicação das normas de proteção do consumidor, em especial o CDC.
Trata-se de negócio jurídico em que uma das partes assume a obrigação de
prestar serviços em favor de pessoa indicada pelo outro contratante
(estipulante), mediante remuneração, enquadrando-se perfeitamente
nos conceitos legais de consumidor e fornecedor (arts. 2º e
3º do CDC) - que definem a natureza da relação contratual de
consumo. O segurado (beneficiário) é consumidor, pois utiliza os
serviços na condição de destinatário final (art. 2º), enquanto que a
operadora do plano se enquadra na definição de fornecedor, uma vez que
presta serviços (art. 3º) de assistência à saúde (do segurado), sendo
esses serviços prestados mediante remuneração (par. 2º do art. 3º). Não
há dúvida, assim, de que o plano de saúde coletivo reveste todas as
características de um típico contrato de consumo e, como tal, deve ser
regido pelas normas do CDC.
A forma da contratação, com a
intermediação do estipulante, no intuito de criar o vínculo jurídico
que liga a operadora aos segurados (consumidores), não descaracteriza a
natureza consumerista do ajuste. A relação contratual que se forma do
acordo de vontades entre o empregador e a operadora do plano com o
intuito de criar um vínculo jurídico, tem a finalidade de estabelecer o
dever de prestar um benefício (assistência à saúde) a
terceiros, inicialmente estranhos ao contrato, mas que posteriormente,
quando manifestam sua concordância com o negócio entabulado pelas outras
duas partes, passam a ser credores concorrentes de uma delas (a
operadora). Assim, a circunstância de os beneficiários do plano coletivo
não participarem inicialmente na formação do vínculo, não lhes retira
quaisquer direitos que teriam acaso fizessem a contratação diretamente,
na forma de planos individuais. Os consumidores não intervêm na
formação do vínculo contratual, pois a contratação não é feita
por eles, e sim pela empresa empregadora (ou entidade
representativa deles), mas os direitos que nascem da contratação, dentre
os quais o de auferir prestação continuada de serviços e cobertura de
custos de assistência à saúde, revertem em favor deles.
O sujeito de direito dessa relação
contratual é o empregado (segurado) e, como tal, pode exigir o
cumprimento das normas e condições pactuadas no contrato, conforme já
proclamado pela jurisprudência do STJ:
"PROCESSO CIVIL. LEGITIMIDADE AD
CAUSAM. BENEFICIÁRIO DE PLANO DE SAÚDE. O beneficiário de plano
de saúde, seja por contratação direta, seja por meio de estipulação
de terceiros, tem legitimidade para exigir a prestação dos serviços
contratados; se o ajuste contiver cláusula abusiva, poderá também
contrastá-la, como resultado da premissa de que os contratos não podem
contrariar a lei, no caso o Código de Defesa do Consumidor. Embargos de
declaração rejeitados”. (STJ, Embargos de Declaração no Ag. 431464/GO,
rel. Min. Ari Pargendler).
Por outro lado, a circunstância de os
contratos privados de assistência à saúde gozarem de uma regulamentação
específica, na Lei 9.656, de 03 de junho de 1998, bem como através das
resoluções da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, não afasta a
conclusão de que fazem parte efetivamente da categoria dos contratos de
consumo. O Código de Defesa do Consumidor (Lei 9.078/90) permanece como uma lei básica, de caráter geral.
É o mesmo fenômeno que acontece em relação a outras subespécies de
contratos de consumo, a exemplo dos contratos bancários, de seguro e os
que regulam as relações com os concessionários de serviços públicos. Não
importa que cada um tenha uma regulamentação específica; o CDC continua
como a lei de caráter geral aplicável a todos eles1.
Diante dessa premissa, afigura-se
plausível a tese da parte Autora, no sentido de que as Resoluções
Normativas editadas pela ANS não podem conflitar com direitos dos
consumidores estabelecidos pela Lei nº 8.078/90, sob pena de invalidade.
Resta saber, destarte, se realmente a
autorização para que os planos de saúde estabeleçam em seus contratos
cláusula de fidelidade contratual de um ano, com cobrança de dois meses
antecipados da mensalidade em caso de pedido de rescisão pelo cliente,
propiciada pelo parágrafo único do artigo 17 da RN/ANS 195/09, conflita com princípios estatuídos em dispositivos da Lei nº8.078/90.
Da literalidade da norma questionada conclui-se que ela autoriza que ambas as partes do contrato a rescindirem unilateralmente o contrato,
desde que já tenha decorrido o período mínimo de 12 (doze) meses de
sua vigência. Se a rescisão anteceder ao prazo de um ano, a parte se
sujeitará ao pagamento de uma multa penitencial, se prevista no contrato
firmado.
1 Nesse ponto cabe reproduzir lição de
Sérgio Cavalieri Filho, in Programa de Direito do Consumidor, págs. 195
e 198: "... Vencidas algumas resistências iniciais, hoje não mais se
questiona a incidência do Código do Consumidor nos contratos de seguro,
mesmo porque o seu art. 3º, § 2º, incluiu expressamente a atividade
securitária no conceito de serviços. Por se tratar de conceito legal,
vale dizer, interpretação autêntica, não há como negar que, além da
disciplina estabelecida no Código Civil e leis especiais, o seguro
também está subordinado aos princípios e cláusulas gerais do Código do
Consumidor sempre que gerar relações de consumo".
Por seu turno, o artigo 51, inciso XI do CDC dispõe serem nulas de pleno direito as cláusulas contratuais que “autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao consumidor”.
A despeito das características especiais
que permeiam os contratos de seguro de saúde individuais ou coletivos,
já que voltados ao resguardo dos bens jurídicos de maior relevo segundo a
Constituição Federal, há que considerar que os contratos de planos de
saúde são atípicos de prestação de serviços, uma vez que são contratos
de adesão de execução diferida e com prazo indeterminado.
Segundo ensina Cláudia Lima Marques2 “os
contratos dessa espécie são de cooperação, no sentido de que a
operadora tem o dever de solidariedade com os consumidores, de
cooperação para a manutenção dos vínculos e do sistema suplementar de
saúde, de forma a possibilitar a realização das expectativas
legítimas do contratante mais fraco”. Essa mesma doutrinadora ensina que
nesse tipo de contrato, a manutenção do vínculo é o interesse
prevalente e abusivas são as cláusulas que permitem rescisão, denúncia
ou cancelamento do contrato. Noutras palavras, nula a cláusula que preconiza, nos contratos de adesão, a vazia denúncia unilateral pela seguradora.
No caso, como visto acima, se está a cuidar de regulamentação normativa que pode servir de base para que os contratos coletivos, de adesão, de seguros de saúde prevejam a possibilidade de também os consumidores denunciarem unilateralmente a avença.
Essa possibilidade, contudo, poderia levar a conclusão equivocada.
É que ao se afirmar isonomia na previsão
de eventual cláusula que permitisse a ambas as partes do contrato o
reincidirem unilateralmente, estar- se-ia olvidando que via de regra, quem rescinde o contrato é o consumidor, justamente pela onerosidade das parcelas mensais ou pelo mau serviço prestado pelas Operadoras de Saúde.
Portanto, não se verificaria a
comutatividade das obrigações que seriam criadas com base na norma
questionada, ressaltando por outro a sua abusividade, ao servir de
fundamento para os contratos de plano de saúde coletivos.
Conclui-se, portanto, que a norma editada pela ANS somente vai ao encontro dos interesses das empresas Operadoras de Saúde,
em detrimento das garantias dos consumidores. É nesse sentido que o
Autor afirma ter havido violação de dever institucional da ANS, já que a
ela incumbiria “articular-se com os órgãos de defesa do consumidor
visando a eficácia da proteção e defesa do consumidor de
serviços privados de assistência à saúde”, nos termos do que dispõe o
artigo 4º, inciso XXXVI da Lei nº 9.961/2000.
Deveras, disposição como a que é
questionada inova na ordem jurídica, extrapolando o dever
institucional da ANS, que é o de “promover a
2 “Contratos no Código de Defesa do Consumidor – O novo regime das relações contratuais”. 5ª. Edição, RT.
defesa do interesse público na
assistência suplementar à saúde, regulando as operadoras setoriais,
inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores,
contribuindo para o desenvolvimento das ações de saúde no País”, como
prevê o artigo 3º da mesma lei antes citada.
A ilegalidade da previsão do ato
administrativo decorre menos da possibilidade de se estipular multa
penitencial do que da possibilidade de vir a servir de fundamento para a
previsão de rescisão unilateral do contrato por parte da empresa
Operadora de Saúde. Cabe salientar que o dispositivo da Resolução Normativa, antes destacado, não prevê a cobrança de multa, limitando-se a estabelecer que “os
contratos de planos privados de assistência à saúde coletivos por
adesão ou empresarial somente poderão ser rescindidos imotivadamente
após a vigência do período de doze meses e mediante prévia notificação
da outra parte com antecedência mínima de sessenta dias”.
Ao abrir as portas para que esse direito
de rescisão unilateral seja previsto em contratos de seguro de saúde
coletivos, em meu sentir, a Resolução Normativa 195/09, expedida pela
ANS, violou direito do consumidor. E o fez porque É evidentemente nula a rescisão
unilateral do contrato, na forma perpetrada, por ofender as disposições
do art. 51, inc. IV, X, XIII, § 1º, incisos I e III, do Código de
Defesa do Consumidor:
"Art. 51. São nulas de pleno
direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao
fornecimento de produtos e serviços que:
IV - estabeleçam obrigações
consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em
desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé
ou
a equidade; X -
permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de
maneira
unilateral; XIII - autorizem o fornecedor a modificar
unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua
celebração;
- 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;
III - se mostra
excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e o
conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias
peculiares ao caso."
Realmente afigura-se inconcebível que a
Agência Nacional de Saúde Complementar edite norma que autorize, por via
transversa, que o contrato de prestação de serviços médicos e
hospitalares seja rescindido unilateralmente pela operadora.
E essa norma, tal como redigida,
efetivamente autoriza tal previsão contratual, pasme-se, com base em
orientação da própria Agência Reguladora. Dessa forma, estar-se-ia
impondo ao aderente, depois vários anos de contrato, o cancelamento
unilateral e novas regras de contratação.
Ocorre que ante as diretrizes básicas do
direito do consumidor, sabe- se que a liberdade de contratar não deve
prevalecer quando praticada de forma nociva, ao submeter a parte mais
fraca da relação jurídica à ação discricionária do outro pólo,
principalmente nos contratos de adesão. E a norma em questão tem como
alvo, justamente, os planos de saúde coletivos, fundamentalmente
sujeitos aos contratos de adesão.
Ocorre que sendo o contrato de
prestação de serviços médicos e hospitalares de trato sucessivo,
pressupõe continuidade no tempo e, estando as condições iniciais
mantidas, não pode ser negada a renovação automática pelo plano de
saúde, seja qual for a alegação que se faça, v.g, desequilíbrio
contratual.
É indubitável que a situação
autorizada pelo artigo 17, parágrafo único da Resolução Normativa
195/2009, expedida pela ANS, coloca o consumidor em desvantagem
exagerada, na medida em que, a despeito da natureza da modalidade
contratual e da função social do contrato, atende única e exclusivamente
ao interesse da operadora do plano de saúde.
Nesse sentido, há jurisprudência:
“1- A cláusula que faculta à
operadora de saúde rescindir unilateralmente o contrato, por meio de
mera notificação, é abusiva, ainda que igual direito seja conferido ao
consumidor, pois importa em afronta à boa-fé objetiva e à equidade e
estabelece vantagem excessiva à fornecedora, tendo em vista as
peculiaridades do contrato de seguro.
2- O contrato em espécie é firmado com o propósito de perdurar no
tempo,
indefinidamente, e, após anos de contribuição, o consumidor não detém
qualquer interesse em rescindir o ajuste, mas, sim, em vê-lo
efetivamente cumprido." (Número do processo:
TJMG,
1.0024.07.453318-3/001, Relator: Francisco Kupidlowski, Data da
Publicação: 10/11/2008).
Portanto, o que se tem em mente é que a previsão contida no artigo 17, parágrafo púnico da RN/ANS nº 195/2009
se presta, tão somente, a atender a interesse das operadoras de Planos
de Saúde, já que o consumidor individual ou a empresa instituidora, em
geral, firmam o contrato de seguro de saúde sob a expectativa de que
este venha a prevalecer por longos anos.
A medida acaba por impor ao consumidor um dever de fidelidade irrestrita, restringindo, irregularmente, o direito de livre escolha, estatuído no CDC.
É indubitável que a situação
narrada nestes autos coloca o consumidor em desvantagem exagerada,
viabilizando, ademais, que os contratos de plano de saúde coletivo
estipulem cláusulas que propiciem às Operadoras de Saúde um ganho
ilícito, no caso de estabelecimento de multas penitenciais no valor de
dois meses, como autoriza o dispositivo questionado.
Diante de todo o exposto, na forma da fundamentação acima desenvolvida, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na presente demanda para:
- a) Declarar nulo o parágrafo único do artigo 17 da RN 195, de 14 de julho de 2009, da ANS, autorizando, de conseguinte, que os consumidores possam rescindir o contrato sem que lhe sejam
impostas multas contratuais em razão da
fidelidade de 12 meses de permanência e 2 meses de pagamento
antecipado de mensalidades, impostas no ato administrativo viciado;
- b) Condenar a Ré à obrigação de publicar, às suas custas,
em dois jornais de grande circulação, em quatro dias intercalados, a
parte dispositiva deste julgado de modo a conferir aos
consumidores o direito de informação;
- c) Condenar a Ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, na ordem de 10 % sobre o valor da causa.
P.R.I
Rio de Janeiro, 26 de fevereiro de 2014.
(assinatura digital)
FLAVIO OLIVEIRA LUCAS
Juiz Federal Titular